moi escreveu: ↑Seg, 22 Junho 2020 - 21:18 pm
E Dante, Okham, Tomás de Aquino, podem falar?
criso escreveu:O Católico Dante, da teófila Divina Comédia! Ockham, o frade franciscano! Aquino e sua Suma Teologica!
Creio não pescou meu provocativo... Entendi que citara os nomes que citou considerando-os lídimos, lúcidos e legítimos representantes da grandiosa confraria mística, autoridades que não poderiam ser caladas. Ora, se se não pode calar seus nomes outros também têm igual direito de falar, mesmo que suas falas não digam o que gostaria que dissessem...
Ocorre meu caro que há um ponto que parece não ainda percebeu: toda especulação metafísica é isso: especulação. Filósofos fazem uso de suas poderosas capacidades reflexivas para conjeturarem sistemas explicativos do que subjaz ao “mundo sensível”, no dizer platônico. Kant afirmava que a metafísica é impossível nos moldes que a ciência é possível. Observe que as várias idealizações metafísicas não se complementam ou se somam (embora Platão pensasse de outro modo, depois falo disso). Os vários pensadores lucubraram, imaginativamente, como estaria fundamentada a realidade visível e perquirível. Os resultados são criativos, inspirativos, enriquecedores... para o pensamento; em termos práticos não servem para nada, são inverificáveis, inaferíveis!
moi escreveu:E Parmênides, Aristóteles, Epicuro, podem falar?
criso escreveu:Epicuro, que supôs a metakosmia! Parmênides e seu poema sobre O Ser que tanto influenciou Platão e toda a tradição metafísica! E, claro, Aristóteles, O Filósofo que considerava a Metafísica como a Filosofia Primeira e a Mãe de todas as Ciências! Você ganharia mais lendo esta única obra (A Metafísica, de Aristóteles) do que perdendo muitas horas da sua vida nesse fórum.
Esse seu parágrafo daria material para muita conversa... vamos a uma pequenina...
Deveras, Parmênides muito influenciou Platão na elaboração do sistema metafísico que urdiu. Porém, não foi só ele, Heráclito e Pitágoras também entraram na jogada. O filósofo ateniense supôs que seus antecessores haviam intuído aspectos de uma realidade maior. Não estavam errados, apenas parcialmente certos. Então, esforçou-se por sintetizar num apanhado único a contribuição daqueles.
Mas como fazer isso, se Parmênides assevera que o ser era imutável, portanto, imóvel: se o ser se movesse deixaria de ser... (sentiu a sutileza?).
Heráclito entendia que a realidade é feita de uma sucessão de mudanças. Ao acabar de escrever esta frase já não mais serei o que começou. Tudo muda o tempo todo no mundo, diria outro filósofo. Nunca é demais lembrar que Heráclito influenciou Hegel, a ponto deste admitir que a base de seu pensamento estava arrimada no pensador grego!
Pitágoras concebia que os números constituiam a essência da realidade. Todas as coisas poderiam ser numericamente explicadas. No pensar dos dessa escola, números não eram meras abstrações, mas entidades concretas. O uno gerou a díade, do encontro desses viera a tríade, assim por diante...
Como coerentificar essas idealizações no mesmo pacote? Platão conseguiu! Sensacional feito!
Para Platão, Heráclito teria identificado o “mundo sensível”, aquele que nossos sentidos percebem, o qual é caricatura do mundo real, o das Ideias Eternas, este vislumbrado por Parmênides. Como não quis deixar Pitágoras de fora, pôs os números numa categoria intermediária, entre o sensível e o real. Pronto, estava descrita a realidade em toda sua plenitude!
Só que tinha um Aristóteles no caminho... Este fora aluno de Platão. Ao examinar detidamente a ideia de seu mestre o pupilo concluiu que o professor levara a realidade maior para esfera inatingível, urdia trazê-la de volta à Terra. E assim concebeu um outro sistema que sacudiu os alicerces do platonismo, embora não tenha alterado o fundamento do pensar platônico de haver um substrato imutável sobre o qual se assentava a realidade mutante. Na visão Aristotélica, as coisas não eram reproduções mal-ajambradas de uma dimensão perfeita, nada disso, as coisas eram constituídas de forma e matéria e uma “força” (ou causa) nelas agia para que realizassem suas naturezas, a essa “força” denominou “causa eficiente”. Todo ser traz em si, potencialmente, sua plena realização para qual caminha inexoravelmente, graças uma outra força que atuava conjuntamente com a causa eficiente, a causa final.
Então, entendo que os grandes pensadores têm o que dizer e merecem ser ouvidos, todos eles, em vez de apenas os de sua simpatia. Seja como for, o que dizem não é passível de verificação objetiva, nem posto sob experimentação, portanto deve ser encarado como demonstração da beleza da capacidade humana de especular a respeito daquilo que não consegue atingir e é nesse âmbito que devem ser estudados. Falo da metafísica, não da filosofia em geral.
Os conhecimentos especulativos, uns de alto nível, outros meros devaneios, dentre os quais se incluem sua gnoseologia, têm seus encantos e para quem com eles se encante nada contra estudá-los detidamente. O que não podem, ou não deveriam, é ser oferecidos como respostas taxativas às inquirições metafísicas com as quais parte da humanidade se preocupa, tipo “de onde vim?”, “para onde vou?”, “o que estou fazendo no mundo?”. Todas os retornos dados a essas e outras questões são provisórios, conjeturais e passíveis de objeções. Sem desconsiderar que, para muitos, tais inquirições não têm sentido (ou resposta) e debalde será o esforço de tentar enfrentá-las...
Considerando essas peculiaridades (ou, se preferir, limitações) é apaixonante conferir até onde a especulação criativa consegue ir, e o que é capaz de produzir nessa rica caminhada. Platão, Aristóteles, Descartes, Kant, Nietschze, Witigenstein, e tantos outros, lucubraram sofisticadas reflexões que oferecem muitas camadas de leituras enriquecedoras.
criso escreveu: Só essa tentativa de antagonizar que levantou, despropositadamente, grandes religiosos e metafísicos, bem como críticos da razão, já é um atestado de incompetência referencial para tangenciar o assunto. Pode haver sim discussão, por exemplo, entre um keynesiano e um hayekiano, ambos formados em economia, e, com seus arcabouços e conhecimentos, comparando e contrastando suas conclusões distintas. Porém, a relação que aqui se apresenta não é entre estudiosos com considerações divergentes, mas Quem Sabe e quem Não Sabe.
Eu poderia sim te ensinar metafísica e misticismo, mas nunca discutir com você. A única relação possível é: você senta, escuta e aprende. Como essa não é a intenção - uma vez que os pressupostos evidenciam não haver a mínima abertura para o Aprendizado, senão a ânsia autoafirmativa de vomitar noções superficiais e preconcebidas -, para que desperdiçar o meu e o seu tempo?
Deverasmente...
A única relação que acha seja possível não acho que seja possível... Voce não conhece meu cabedal de saber místico, metafísico, tampouco sabe de minha escola... E se eu for um peripatético? Como poderia sentar e escutar? Peripatéticos aprendem caminhando...
Desconsiderando sua sarrafada depreciativa do saber alheio, digo-lho que metafísica se discute sim, isso é o que vem sendo feito história a fora. Pré-socráticos discutiam a arché (fundamento): terra, ar, fogo, água, quatro elementos, átomo foram propostas de explicar a base da existência.
Aristóteles discutiu com Platão. Descartes discutiu com os que negavam ser o conhecimento possível, etc., isso para ficar nos grandes da filosofia. A gnose, que é uma filosofia de meia colher, possui diversas escolas que postulam concepções contraditórias umas das outras e o pau come. Sem falar das religiões, onde o pau come de verdade...
Louvo-lhe, sem blague, pelo ilibado domínio desses mistérios esotéricos, humildemente admiro o esforço realizado para dominar tais conhecimentos, mas prefiro dedicar minhas horas de ócio produtivo a examinar um Descartes, aguentar um Kant, ou Hegel, me deleitar com Bertrand Russel, tentar entender o que Marx queria, coisas assim...
Mas, se quiser discutir, tamos juntos...