Os algoritimos criam essas tocas de coelho pois a ideia é fazer o usuário passar o máximo de tempo possível se afundando naquelas "informações," não há avaliação nenhuma além disso no método, ao que parece.Pedro Reis escreveu: ↑Sex, 06 Novembro 2020 - 14:38 pmEste é o tipo de meme que me obriga a parar tudo e desabafar aqui.
Sintetiza e ilustra como funciona o processo de desinformação em massa em curso nestes tempos que vivemos.
A imagem no meme evangélico é como uma peça publicitária: uma mensagem é passada instantaneamente de forma simples e por isso mesmo absorvida sem passar pelo crivo do senso crítico. A pessoa vê, parece imediatamente fazer sentido, e é influenciada sem perceber. Sem refletir sobre o assunto.
É como quando alguém vê uma propaganda de cigarro onde um galã fumando determinada marca está praticando algum esporte radical e depois se vê cercado de mulheres bonitas...
A ideia - totalmente ridícula - é a que de se você fumar cigarros desta marca assim será visto pelos outros. E aquele será seu estilo de vida.
O truque é fazer o consumidor absorver a mensagem sem pensar sobre ela. Porque se pensar vai entender que fumar não favorece a prática de esportes. Vai deixa-lo doente, sedentário, feio e ainda por cima gastando com cigarros e médicos, mais pobre. E nada disso ajuda a conquistar um harém de mulheres bonitas.
Mas publicidade não te faz refletir. Te faz sentir, desejar. É aquele doce de leite em câmara lenta escorrendo sobre amendoins caramelizados que serão cobertos por calda de chocolate que te farão comprar o confeito no supermercado. Você vai sentir desejo ao ver o produto na prateleira sem nem saber o porquê.
A este poder comunicacional do impressionismo típico em uma mensagem publicitária, o meme de internet agregou dois outros superpoderes de influenciar pessoas:
- A facilidade de replicação espontânea.
- O fato da mensagem ser passada por alguém do seu círculo social. E a psicologia humana faz com que a pessoa tenha essa tendência de querer se adequar ao grupo, de pensar de acordo com o consenso.
Estas duas armas a publicidade nunca teve e por isso as redes sociais, insidiosamente, estão sendo utilizadas extensivamente para influenciar segmentos de opinião pública.
E ainda existem os algoritmos!
Porque a ideologia talvez não seja do inferno, mas os algoritmos são diabólicos. Identificam suas preferências e te entulham cada vez mais com o mesmo tipo de conteúdo, isolando a pessoa de outros pontos de vista contraditórios e claro, fazendo com que ela se identifique ainda mais com esse tipo de conteúdo. O que será percebido pelos algoritmos que por sua vez empurrarão ainda mais conteúdo do tipo, em um ciclo de retroalimentação que leva à radicalização e é o grande responsável por este clima de polarização extremista surgido não só aqui, mas no mundo.
Mas o que faz com que um meme seja uma unidade de informação explosivamente replicável é a sua natureza rasa, de fácil absorção. O meme não discute nada, não argumenta, muitas vezes apenas replica algum preconceito arraigado, algo que as pessoas consideram verdadeiro apenas por ser o padrão comum. Não por fazer sentido mas pela ausência de contraste.
E nossos cérebros tendem a ver o padrão como algo intrínseco, e não circunstancial como muitas vezes é.
Como naqueles textos racistas de Kardec e outros autores vitorianos que enxergavam a raça negra como intrinsecamente inferior, sem considerar o quão diferentes eram as circunstâncias em que viviam.
Memes como esse estão convencendo milhões de brasileiros que existe uma ideologia de gênero satanista tentando perverter a natureza das crianças e induzi-las à homossexualidade. Eles, os esquerdistas, querem destruir a família e é claro que se o menino não usar roupinha azul e brincar de carrinho não vai gostar mais de menina.
Mas se alguém parasse pra pensar perceberia que "ideologia de gênero" são duas palavras que juntas não produzem significado. E não existe, nunca existiu, essa tal ideologia. O que existem são estudos de gênero em todas as principais universidades do mundo.
Identidade de gênero é aquele conjunto de padrões que uma determinada cultura associa/atribui às pessoas de um determinado sexo biológico. E isto sim, deveria ser óbvio, é um construção social, cultural.
Não dá para imaginar que a genética determine que o menino vista boné e brinque de carrinho. Que faça meninas gostarem de roupinha rosa.
Basta observar diferentes culturas para ter a prova de que os atributos de gênero não são inatos: entre os indígenas do Brasil são os homens que se pintam, se enfeitam com plumas, usam adornos, colares e o escambau. As índias passam a vida de cara lavada e não ligam pra essas "frescuras".
Já os soldados romanos usavam saias e adotavam um padrão sexual que não corresponderia à nossa ideia de masculinidade. Mas para eles, ao contrário, alguém que não seguisse este padrão é que teria sua masculinidade questionada.
Exemplos assim não faltam e o que os estudiosos acreditam é que não há motivo, no séc. 21, para impor modelos de gênero às pessoas e além disso estes modelos acabam, de alguma forma, contribuindo para a desigualdade entre os sexos porque impõem artificialmente diferentes padrões, direitos e responsabilidades a homens e mulheres.
As teses são robustas, substanciadas, mas o povão vai achar mesmo é que existe um monte de sociólogos comunistas, pervertidos e retardados defendendo que sexo biológico é somente um constructo social.
Agora, esses algoritimos foram armamentizados por outros grupos e estados para espalhar desinformação propositalmente? Parece que sim. O próprio marketeiro falcatrua steve bannon já mandou que tem é que mexer com as emoções da pessoa, não com o racional.
A mensagem rasa, com ares de bem vs mal, agrada muita gente. E convenhamos que o pessoal que vai nessas igrejas e gosta dessa narrativa não são as lâmpadas mais brilhantes da caixa, digamos assim.