Gorducho escreveu: ↑Qua, 23 Abril 2025 - 10:05 am
Sr. Cal Kestis escreveu:O espiritismo não se encaixam em nenhuma dessas concepções. Nem Deísta, nem panteísta, nem Panenteísta e nem Teísta.
Inobstante, o Gabriel Delanne e o Léon Denis podemos dizer são os Doutores – no sentido usado pela ICAR – do Kardecismo. Então os posicionamentos deles quase-canônicos. Aí temos como mencionado no artigo do Humberto Schubert:
IX. - L'Univers et Dieu escreveu:O que a Ciência destruiu para sempre foi a noção de um Deus antropomorfo, feito à imagem do homem, e exterior ao mundo físico. Uma noção superior veio substituir aquela: a de um Deus imanente, sempre presente no seio das coisas. Para nós, a idéia de Deus não mais exprime hoje a de um ser qualquer, porém a do Ser que contém todos os seres.
[…]
O Ser Supremo não existe fora do mundo; lhe é parte integrante, essencial, […]
Por isso não discordo a priori
Denis e Delanne são autores importantes, mas essas ideias não têm respaldo na codificação espírita. Kardec foi claro ao estabelecer uma doutrina que distingue Deus da criação, sem confusões com panteísmo ou visões semelhantes. Qualquer afirmação contrária a isso entra no campo da opinião pessoal, não da doutrina.
O Espiritismo rejeita com clareza a ideia de um Deus como "o Ser que contém todos os seres" ou "parte integrante do mundo", mesmo que em sentido metafórico.
A codificação é direta:
“Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.” (O Livro dos Espíritos, Q.1)
Se Deus é a causa, o universo e os seres são os efeitos. A causa não se confunde com o efeito, nem pode estar “diluído” no universo, como se fosse apenas mais um elemento da criação, já que é a causa e não o efeito.
Além disso, a doutrina ensina (Q.27) que há dois elementos gerais no universo: a matéria e o espírito, e acima de tudo, Deus.
Deus, espírito e matéria constituem o princípio de tudo o que existe, a trindade universal.
Esses três elementos são distintos entre si. Não há fusão. Deus não está "no mundo" como parte dele, nem "contém os seres" como se fosse um organismo cósmico.
Sua presença se manifesta:
pela ação constante das leis naturais, que são expressão de Sua vontade;
pela atuação dos Espíritos superiores, que executam Sua vontade de modo inteligente e ordenado;
e por uma “presença” que não é espacial ou física, mas moral e organizadora - aquilo que Kardec chamou de “irradiação” da inteligência suprema, sempre com sentido não material.
Além disso, no panteísmo, Deus se dissolve na criação. Com isso, desaparece a noção de uma inteligência moral que dirige o universo. E sem essa inteligência, o livre-arbítrio, e a reencarnação deixa de fazer sentido - vira apenas um mecanismo cego, sem propósito. Isso contrária a base do espiritismo.
Se os seres imperfeitos estão “em Deus” ou são “partes d’Ele”, então o mal, o erro, a ignorância - que justificam a necessidade da reencarnação - também estariam n’Ele.
Resultado? A justiça divina vira autopunição.
Ou seja, Deus pune a si mesmo. Isso quebra qualquer noção de moral transcendente.
Se Deus está em tudo, e tudo é expressão d’Ele, então até as escolhas más seriam expressões da divindade.
Logo, a culpa, o mérito, a responsabilidade pessoal - que são a base da reencarnação como instrumento de educação moral - perdem sentido real.
Livro dos Espíritos:
14. Deus é um ser distinto, ou será, como opinam alguns, a resultante de todas as forças e de todas as inteligências do Universo reunidas?
“Se fosse assim, Deus não existiria, porquanto seria efeito e não causa. Ele não pode ser ao mesmo tempo uma e outra coisa.
15. Que se deve pensar da opinião segundo a qual todos os corpos da Natureza, todos os seres, todos os globos do Universo seriam partes da Divindade e constituiriam, em conjunto, a própria Divindade, ou, por outra, que se deve pensar da doutrina panteísta?
“Não podendo fazer-se Deus, o homem quer ao menos ser uma parte de Deus.”
16. Pretendem os que professam esta doutrina achar nela a demonstração de alguns dos atributos de Deus: sendo infinitos os mundos, Deus é, por isso mesmo, infinito; não havendo o vazio, ou o nada em parte alguma, Deus está por toda parte; estando Deus em toda parte, pois que tudo é parte integrante de Deus, ele dá a todos os fenômenos da Natureza uma razão de ser inteligente. Que se pode opor a este raciocínio?
“A razão. Refleti maduramente e não vos será difícil reconhecer-lhe o absurdo.”
Esta doutrina faz de Deus um ser material que, embora dotado de suprema inteligência, seria em ponto grande o que somos em ponto pequeno. Ora, transformando-se a matéria incessantemente, Deus, se fosse assim, nenhuma estabilidade teria; achar-se-ia sujeito a todas as vicissitudes, mesmo a todas as necessidades da Humanidade; faltar-lhe-ia um dos atributos essenciais da Divindade: a imutabilidade. Não se podem aliar as propriedades da matéria à idéia de Deus, sem que ele fique rebaixado ante o nosso pensamento, e não haverá sutilezas de sofismas que cheguem a resolver o problema da sua natureza íntima. Não sabemos tudo o que ele é, mas sabemos o que ele não pode deixar de ser, e o sistema de que tratamos está em contradição com as suas mais essenciais propriedades. Ele confunde o Criador com a criatura, exatamente como o faria quem pretendesse que engenhosa máquina fosse parte integrante do mecânico que a concebeu.
A inteligência de Deus se revela em suas obras como a de um pintor no seu quadro; mas, as obras de Deus não são o próprio Deus, como o quadro não é o pintor que o concebeu e executou.
'
O Céu e o Inferno - O futuro e o nada
7. Nesta doutrina, a fonte universal de inteligência que fornece as almas humanas é independente da divindade, ser superior e distinto que anima tudo por sua vontade; não é precisamente o panteísmo. O panteísmo propriamente dito difere dela, segundo ele, em que o princípio universal de vida e de inteligência é o próprio Deus. Deus é ao mesmo tempo espírito e matéria; todos os seres, todos os corpos da natureza compõem a divindade da qual são as moléculas e os elementos constitutivos; numa palavra, Deus está em tudo e tudo é Deus; Deus é o conjunto de todas as inteligências reunidas; cada indivíduo, sendo uma parte do todo, é ele mesmo Deus; nenhum ser superior e independente comanda o conjunto; o universo é uma imensa república sem chefe, ou melhor, onde cada um é chefe com poder absoluto.
8. A esse sistema podem-se opor inúmeras objeções, das quais as principais são estas. Não podendo a divindade ser concebida sem o infinito das perfeições, pergunta-se como um todo perfeito pode ser formado de partes tão imperfeitas e necessitando progredir. Estando cada parte submetida à lei do progresso, daí resulta que o próprio Deus deve progredir; se ele progride sem cessar, deve ter sido, na origem dos tempos, muito imperfeito. Como um ser imperfeito, formado de vontades e de ideias tão divergentes, pôde conceber as leis tão harmoniosas, de tão admirável unidade, sabedoria e previdência que regem o universo? Se todas as almas são porções da divindade, todas concorreram para as leis da natureza; como explicar que murmurem sem cessar contra essas leis que são sua obra? Uma teoria não pode ser aceita como verdadeira a não ser com a condição de satisfazer a razão e de dar conta de todos os fatos que ela abarca; se um único fato a desmentir, é que ela não está com a verdade absoluta.
9. - Do ponto de vista moral, as consequências são igualmente ilógicas. É primeiro para as almas, como no sistema precedente, a absorção num todo e a perda da individualidade. Se se admitir, segundo a opinião de alguns panteístas, que elas conservam sua individualidade, Deus não tem mais vontade única; é um composto de miríades de vontades divergentes. Depois, sendo cada alma parte integrante da divindade, nenhuma é dominada por um poder superior; ela não incorre, por conseguinte, em nenhuma responsabilidade por seus atos bons ou maus; ela não tem nenhum interesse em fazer o bem e pode fazer o mal impunemente visto que é senhora soberana.
Kardec a respeito de uma obra que trata da pluraridade das existências:
As numerosas citações feitas pelo autor, e que estão longe de ser completas, provam quanto é geral a ideia da pluralidade das existências e que em pouco terá passado ao estado de verdade adquirida. Sobre outros pontos, ele se afasta completamente da Doutrina Espírita; estamos longe de partilhar de sua opinião sobre todas as questões ele que aborda em seu livro, notadamente no que concerne à divindade, à qual ele atribui um papel secundário, e à natureza íntima da alma, cuja espiritualidade contesta. Seu sistema é uma espécie de panteísmo que caminha ao lado do Espiritismo, e parece ser um termo médio para certas pessoas que não querem o ateísmo, nem o niilismo, nem o espiritualismo dogmático. Por mais incompleto que seja, não deixa de ser um notável progresso sobre as ideias materialistas, das quais está muito mais afastado do que das nossas. Salvo alguns pontos muito controvertidos, a obra contém vistas muito profundas e muito justas às quais o Espiritismo não deixa de associar-se.
Mesmo vindo de autores respeitáveis, essa concepção de Deus como “parte integrante do mundo” não se mantém dentro da lógica kardequiana. Kardec deixou claro, ao longo de toda a codificação, que Deus é distinto da criação, causa primária de todas as coisas, e princípio regulador das leis morais que orientam a ação livre dos Espíritos.
'