Hipatia escreveu: ↑Qua, 07 Outubro 2020 - 12:31 pm
criso escreveu: ↑Ter, 06 Outubro 2020 - 03:39 am
sou eu que não entendo
Acertou!!
" Quousque tandem abutere, Catilina?"
Bom dia a todos. Quanto à bobice do argumento:
Primeiramente, para declarar uma coisa como má, eu preciso tanto:
1-compreender a natureza da coisa a que me refiro
2-abarcar com o pensamento essa qualidade metafísica que chamamos maldade
E isso tudo dependerá muito mais de nossas limitações e interpretações do que das coisas mesmas.
Por ex.:
imagine um pirralho se entupindo de chocolate,
para sua consciência imediata, aquilo é "bom";
para a mãe, que enxerga mais à frente, é "mau":
ele certamente passará mal e estará sendo indisciplinado.
Daí, a mãe tira o chocolate da criança que esperneia e se zanga
porque, do ponto de vista dela, aquilo é sentido como algo desconfortável, hostil.
Ora, o chocolate aqui é bom ou mau? E a atitude da mãe?
Estar na fila do BB ou na rodoviária de Cabo Frio sob o sol quente em pleno verão, é uma experiência "má".
Mas se você estivesse bebendo água de coco e relaxando ali na praia do forte, ou mergulhando, será tomada como boa.
Ora, o sol aqui é bom ou mau? E para todas as plantas que necessitam de sua luz?
Estar na rua, sem guarda-chuva, em plena chuva invernal de Santa Maria a -2ºC, é uma experiência desagradável.
Estar em casa, agasalhado e lendo um bom livro, tomando um café ou chá, seria agradável.
A chuva aqui é boa ou má? E para a natureza, como um todo?
Gosto muito do versículo que diz:
"Ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos."
Com isso, chego à seguinte conclusão:
nunca é nas "coisas mesmas" que reside o "bom" ou "mau",
mas somente nas relações que podemos estabelecer com elas.
E, ainda essas relações, não são absolutamente boas ou más,
porque vão ter mais a ver com o indivíduo e a maneira como se sente afetado.
Essa é a minha primeira tese: de que a Realidade em Si é pura e imaculada.
Só seres racionais e conscientes podem instrumentalizá-la segundo fins diversos e próprios -
e somente nessas intenções pode residir um bem ou mal realmente absoluto e verdadeiramente metafísico.
Daí, chegamos à minha segunda tese: de que o verdadeiro bem e o verdadeiro mal são metafísicos.
Se eu intenciono, por inveja, te prejudicar, mesmo que utilize meios materiais para isso, é na minha intenção que faço o mal nascer.
E o que for que eu faça é somente uma presentificação de um sentimento que, em última instância, é completamente imaterial.
Por exemplo: "conforto", que é algo físico, não pode ser considerado "Bem".
Nenhum mártir nunca haveria se sacrificado por valores maiores se tivesse por critério seu conforto pessoal.
É muito confortável, para o organismo, deleitar-se em preguiça, luxúria e gula.
Sendo que nenhuma dessas coisas é boa para nossa Alma.
Se DEUS, ou o SER ABSOLUTO, nos permitisse nos degradarmos em vícios,
e criasse uma existência cômoda e propícia para isso, ele não seria Omnibenevolente.
Por outro lado, pensemos no que há de metafisicamente Bom: virtudes como Coragem e Caridade.
Essas virtudes ganham sua seidade precisamente pelos males de que são a negação.
Em outras palavras, o "Ser" delas parte da negação dos erros, respectivos, de Covardia e Cobiça.
Eu me torno Corajoso e Caridoso na medida em que renuncio minha própria inclinação à Covardia e à Cobiça,
assim como a criança se torna um adulto autônomo e esclarecido na medida em que supera sua própria imaturidade pueril.
E é precisamente pela imaturidade ser seu ponto de partida, que o percurso, diferenciando-se deste, há de ser o da maturidade.
Ora, retomemos o exemplo da mãe e do chocolate -
É somente passando na prova da disciplina que a alma da criança pode se desenvolver, adquirindo virtudes de Temperança, Disciplina etc.
E o universo em que existimos, chamado "imperfeito" pelo Pedro Reis, é cheio de oportunidades para o desenvolvimento de atributos morais,
bem como para a gradativa superação dos desafios impostos pela natureza.
Se eu tenho um criador omnibenevolente, ele quer que eu amadureça em benevolência ou que me degrade comodamente em vícios e paixões?
Desde o segundo em que pisamos nesse universo, somos colocados diante de dilemas, escolhas e oportunidades para nosso crescimento espiritual.